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segunda-feira, 31 de março de 2008

Mar Adentro

Hoje, assisti na faculdade, a um filme espanhol, cujo nome é o título desta postagem. Trata da história real de um cidadão, que, aos 25 anos, no final dos anos 60, sofre um acidente que o deixa tetraplégico. Desde então, ele vive deitado, sem poder se mexer, e sendo cuidado por familiares e amigos, até que, depois de quase trinta anos, ele perde de vez a vontade de viver e pede autorização da Justiça Espanhola para que seus entes queridos o ajudem a morrer sem serem incriminados.
Esta é uma situação muito difícil de lidar. Muito difícil saber o que fazer com uma pessoa assim, dar a ela uma boa razão para continuar a viver. Muito fácil dizer a ele que a vida é sagrada e que nós não somos donos dela. Não que a religião esteja errada em falar assim, mas se você se imaginar no lugar de uma pessoa nesta situação, você saberia o que fazer? Como desfrutar de uma vida, preso em um corpo que não funciona a contento e que não te ajuda a usufruir as coisas boas que a vida oferece ou conquistar tudo que você deveria ter, como trabalho, casamento e filhos? Viver preso e relativamente sozinho, sem ter acesso a essas coisas que mencionei, vale a pena? Não sei. O que posso dizer é que não devemos julgar essas pessoas, devemos ser solidários a elas, não ao ponto de ajudá-las a morrer, mas ajudá-las a viver. Eu no lugar dele, me sentiria muito mal, mas afastaria a idéia de morte de mim, em consideração às pessoas que me amam. Tentaria me manter em contato com Deus, ainda que eu O achasse injusto por me deixar passar por aquela situação. Sendo assim, somente Ele poderia me ajudar a suportar aquela dor. Eu me emocionei com o filme, embora algumas cenas fossem engraçadas, principalmente quando o protagonista estava muito sarcástico.
Toda semana, eu tenho aulas práticas em um ambulatório de infectologia. Todos os pacientes que eu vi até agora são portadores do HIV. A maioria deles contraiu o vírus no casamento. Deve ser por isso que a Igreja Católica condena a camisinha. Além de ela estimular a libertinagem das pessoas e de ser um método contraceptivo, ela não é suficiente para evitar a disseminação do vírus porque depende da maneira como é usada e da qualidade do material e por conta dos contágios matrimoniais. Se você se casa com alguém, é porque, além de amar a pessoa, confia nela, quer ter o máximo de contato íntimo com ela pelo resto da vida e deseja ter filhos com ela, não é? Vai pensar em usar camisinha com ela? Acho que não. Se houvesse mais fidelidade nos relacionamentos, talvez o preservativo não fosse tão necessário e a incidência de AIDS diminuiria consideravelmente. É louvável que tenham diminuido os casos de recém-nascidos infectados, graças às políticas de profilaxia no pré-natal (ainda sim, tive o desgosto de ver uma criança de 7 anos com AIDS internada na Santa Casa que veio à óbito, na semana seguinte) e lastimável que muita gente ainda é infectada da maneira que menos espera. Por isso, mais importante do que usar o preservativo, é saber escolher a pessoa certa, na hora certa.
Achei oportuno falar aqui sobre os pacientes soropositivos porque, embora eles não tenham tantas limitações como o personagem do filme e a maioria deles estejam assintomáticos, com a infecção devidamente controlada por terapia anti-retroviral, acredito que eles também sofrem bastante, seja pelo preconceito, seja pela consciência do fardo que estão carregando dentro de si pelo resto de suas vidas. Não sei até que ponto eles se sentem estimulados a continuarem vivos. Eu tento imaginar o que se passa na mente deles. À grosso modo, deve ser uma espécie de morte em vida. Então, não pretendo ser infectologista. Não que eu tenha preconceito com os pacientes, mas me sinto meio angustiado quando estou com eles. O sofrimento deles me afeta. Às vezes chego a ter a sensação de que posso pegar o vírus pelo ar. Me afeta mais ainda saber que, por enquanto, não há mais nada que possamos fazer por eles, mas ainda temos a esperança de um dia podermos libertá-los. Você pode dizer que eu ficaria afetado com o sofrimento de qualquer paciente. É verdade, mas tratar um paciente soropositivo não é a mesma coisa que tratar um paciente diabético, pois este deve sofrer menos porque tem menos limitações.
Acho que tudo isso deve ter uma explicação racional. Estou em uma fase em que, depois de ter visto tanta coisa na faculdade, depois de ter estudado tantas doenças, estou com muito medo de contraí-las. Deve ser o hipocondrismo ou hipocondria transitória do 3º ou do 4º ano. Ainda que as probabilidades de contrair aquelas doenças, especialmente as mais graves, ou de estar na mesma situação do personagem do filme sejam muito pequenas, eu sinto pavor só de pensar nisto. Enfim, tudo que eu vejo na minha carreira acadêmica está me afetando emocionalmente.
Então, todas as noites eu rezo por aquelas pessoas que carregam um sofrimento vitalício e entrego nas mãos de Deus minha saúde, minha segurança e meu destino, sempre agradecendo a Ele por estar saudável hoje, sem nenhum tipo de limitação ou de deficiência, implorando para que Ele me guarde assim, para que eu possa realizar meus sonhos, inclusive os de casar e de ter filhos. Me lembro sempre de pedir tudo isso também em favor de parentes e amigos meus. Aconselho você a fazer o mesmo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Aprendi muito