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Subject: [dceufc] Novos tempos :: Cristovam Buarque
Date: Mon, 18 Aug 2008 13:51:44 -0300
O Globo
Novos tempos :: Cristovam Buarque
A UNE vai fazer uma caravana nacional para debater educação, saúde e divulgar práticas de sexo seguro. Isso pode significar que o movimento universitário esteja saindo da paralisia e do corporativismo para encontrar uma nova causa. Mas, ao mesmo tempo, passa a idéia de que os universitários continuam desligados da necessidade de o Brasil fazer uma revolução na sua sociedade.
Nada indica que a caravana da UNE terá a missão de levar consciência política, sonhos alternativos, defesa de utopias, contestações da estrutura política e social. Por isso, os mais velhos ficam criticando os jovens de hoje, lembrando que no passado lutavam pela revolução social. Mais importante do que esse saudosismo arrogante é entender por que a juventude universitária ficou conservadora, enquanto a realidade social de hoje é ainda mais perversa do que era antigamente: a corrupção domina, a violência controla as ruas, a desigualdade se transformou em apartação, a educação básica é uma calamidade vergonhosa, o planeta se aquece. Nunca foi tão necessária uma juventude revolucionária.
Alguns põem a culpa nos 21 anos da ditadura, esquecendo-se de que já temos 23 anos de democracia. A culpa é mais da democracia do que da ditadura, porque, naquele tempo, havia uma forte militância juvenil pela liberdade. A democracia calou os intelectuais e alienou a juventude. O abandono da mística revolucionária pela juventude universitária tem outras razões.
Antes, a revolução defendida pela juventude universitária era a favor da nação, do povo, mas também dos jovens. O país estava estancado, as classes médias eram empobrecidas, a distribuição de renda traria vantagens para pobres, classes médias e até ricos, porque, dinamizando a demanda, os negócios floresceriam. Com o apartheid social que caracteriza o Brasil de hoje, a classe média sabe que seu padrão de vida e de consumo sairá perdendo se houver distribuição de renda para os pobres. Os jovens universitários percebem que não há espaço para todos. E preferem tornar-se conservadores, porque sabem que a revolução atingirá seus interesses. Para eles, os únicos empecilhos para chegarem ao paraíso são a Aids e as mensalidades da universidade particular. A revolução está no Prouni e no sexo seguro, bandeiras da caravana da UNE. Parte dos universitários nem sequer defende o Prouni, porque ele beneficia a classe média baixa.
Por isso, a juventude universitária não defende a necessária revolução na educação de base. Intui que, se todos os pobres do Brasil tiverem educação de máxima qualidade, a juventude de classe média e seus filhos sofrerão forte concorrência. A exclusão educacional e a má educação dos que sobrevivem até o fim do ensino básico é uma forma de proteger os que têm acesso a boas escolas.
O governo Lula é outra razão da alienação. Os jovens se sentem obrigados a apoiar o governo atual, porque têm origem de esquerda, e porque acreditam que ele age no limite do possível. Ao limitar-se ao que é possível, a juventude envelhece.
Mas a culpa não é dos jovens. É dos que se negaram a construir novos sonhos que pudessem mobilizar os jovens. Cooptados pela idade ou pelos privilégios do sistema de apartação, desiludidos com a queda do Muro de Berlim, perplexos com o aquecimento global, os mais velhos abandonaram os jovens. Deixamos de oferecer alternativas, utopias, bandeiras de luta. Os jovens ainda tentam se mobilizar, mas não encontram bandeiras, mapas, propostas radicais que os encantem.
A esperança está nos jovens. Eles encontrarão o próprio caminho quando perceberem que o fim da exclusão social e a educação universal de qualidade são fundamentais para construir a nova sociedade de que o Brasil precisa. É possível que, nessa viagem em defesa do sexo seguro, os ônibus da UNE provoquem inveja aos velhos. Mas não despertarão a juventude para a maior necessidade dos novos tempos: uma revolução pela educação de qualidade para todos, com os filhos dos trabalhadores na mesma escola que os filhos do patrão. Isso se chama educacionismo.
CRISTOVAM BUARQUE é senador (PDT-DF).
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