O financiamento da saúde e a responsabilidade ético, civil e penal do médico foram alguns dos temas discutidos durante a 4ª Jornada Médico-Jurídica Sindical, realizada nos dias 09 e 10 de maio, no Hotel Olympo. A promoção do Sindicato dos Médicos do Estado do Ceará e da Federação Nacional dos Médicos reuniu em Fortaleza representantes de entidades médicas e jurídicas de vários estados brasileiros que, durante dois dias, debateram assuntos ligados ao mercado de trabalho e a judicialização da saúde.
O vice-presidente da Associação Médica Brasileira, Florentino Cardoso Filho, foi um dos conferencistas do primeiro painel, que discutiu o "Financiamento da Saúde". Ele destacou a necessidade de se garantir a sustentabilidade do Sistema Único de Saúde, acrescentando que o Brasil não aplica eqüitativa e eficientemente os recursos destinados à saúde. De acordo com pesquisas feitas pelo IPEA (fevereiro de 2008) de 1995 a 2005 o investimento federal em saúde pública caiu de 5% para menos de 2%.
Florentino ressaltou ainda a regulamentação da Emenda Constitucional 29. Ela foi aprovada pela Câmara Federal com baixos valores de contribuição da União para o custeio do SUS. Com o protesto de toda a categoria, a emenda foi modificada no Senado Federal, através do PLS 121/07- Complementar, de autoria do senador Tião Viana e aprovado recentemente (06.05.08). De acordo com o Projeto de Lei do Senado, a União destinará à saúde, por ano, o equivalente a 10% das receitas correntes brutas a partir de 2011 (8,5% em 2008; 9% em 2009; e 9,5% em 2010). O PLS ainda terá que ser aprovado na Câmara e sancionado pelo Presidente Lula. Enquanto isso, vale o que está na EC 29: A União destina à saúde o mesmo valor do ano anterior, acrescido do percentual de crescimento do PIB.
Ao contrário dos que muitos dizem de que saúde é só despesa, Florentino Cardoso Filho fez questão de mostrar durante sua fala que o segmento saúde também arrecada. "A saúde gera 8% do PIB, responde por 10% dos postos formais de trabalho qualificado e emprega nove milhões de brasileiros em atividades de maior qualificação".
Outro conferencista do painel "Financiamento da Saúde" foi o médico Francisco Monteiro, que ressaltou a importância do Sistema Único de Saúde, defendeu a CPMF e um plano de cargos e carreiras com melhores salários para a categoria médica. Já o diretor de Assuntos Jurídicos do Sindicato dos Médicos, Luis Emanuel de Assiz disse que nunca existiu no Brasil uma real e efetiva política de saúde, nem um planejamento de saúde em nível nacional e que é preciso garantir que os recursos destinados à saúde sejam aplicados exclusiva e integralmente em saúde, e não sendo desviados para outros setores.
A Saúde, segundo o dr. Emanuel de Assiz, nunca foi realmente encarada como prioridade pelos governos brasileiros. Desde os tempos do Império, a Saúde é tratada como despesa e não como investimento social. Só para exemplificar, no Brasil, os investimentos em saúde pública giram em torno de US$ 180 por habitante; a Argentina investe cerca de US$ 300; em países como o Canadá, o número chega a US$ 2.500.
Para o presidente do Conselho Regional de Medicina do Ceará, Ivan Moura Fé, que substituiu o presidente do Conselho Federal de Medicina, Edson Andrade, são poucos os países ricos que "ousaram" em implantar um sistema de saúde como o SUS. "A nossa luta agora é ética", disse Moura Fé, acrescentando que é preciso definir o que são gastos com saúde "para que não se fique escamoteando as finalidades desses recursos e que eles realmente cheguem à ponta, nos municípios".
O presidente da Federação Nacional dos Médicos, Eduardo Santana, também defendeu o Sistema Único de Saúde, dizendo que 160 milhões de brasileiros têm o SUS como referência. "É aí que temos que enfrentar com ética o exercício da medicina". Santana explicou que na década de 60 foram dados os primeiros passos para a criação de um sistema de saúde para todos. Os estudos foram sendo ampliados, formando um sistema de saúde que atende hoje o conjunto das pessoas que vivem no território brasileiro. "Qualquer indivíduo que atravesse a fronteira é atendido do mesmo jeito". Santana defendeu também o projeto do senador Tião Viana, que modifica a EC 29, pedindo que todos os médicos assumam a sua responsabilidade de cidadão e lutem para que o PLS 121/07 seja aprovado na Câmara e sancionado pelo Presidente da República.
Responsabilidade Administrativa, Civil e Penal do Médico
"Analisar a dimensão jurídica da responsabilidade administrativa, civil e penal do médico é de extrema importância, pois no Brasil, por determinação constitucional, a saúde é direito de todos e dever do Estado, cabendo ao Poder Público, por lei, regulamentar, fiscalizar e controlar as ações e serviços de saúde", disse o advogado Paulo Quezado, do Conselho Federal da OAB-CE, durante a 4ª Jornada Médico-Jurídica Sindical. E completa seu pensamento dando sua opinião sobre a grande carga de responsabilidade que é posta nos profissionais da medicina, afirmando que "a função do médico sempre guardou um conteúdo místico, divinizado, tornando a figura deste profissional diante do imaginário popular um "semi-deus".
Quezado destacou a importância do profissional informar todos os riscos de uma cirurgia ao paciente. Defendeu o cuidado com erro de diagnóstico de exames radiológicos e acidente médico. Da responsabilidade Penal, ele destacou crimes cometidos pelos médicos e falou das penas para cada caso, como violação de segredo profissional, omissão de notificação de doença contagiosa, exercício ilegal da medicina, falsidade de atestado médico e omissão na assistência a recém-nascidos.
Dos crimes comuns cometidos por qualquer pessoa, mas decorrentes da profissão médica, foram destacados e debatidos, homicídio culposo, eutanásia, lesão corporal culposa, omissão de socorro e charlatanismo. Outros temas foram abordados por Paulo Quezado na tarde do primeiro dia da jornada, como casos de auto-mutilação para receber seguros, falsidade de atestado médico e responsabilidade administrativa ou responsabilidade civil do Estado por ato de médico agente público.
Ainda sobre o mesmo assunto, Ivan Moura Fé, presidente do CREMEC e Antônio Tadeu Filho, coordenador da Assessoria Jurídica de Defesa da Saúde Pública, explanaram sobre a relação médico e paciente e o respeito entre as duas partes.
Carreira de Estado para os médicos
Lutar por uma carreira de estado para o médico, tolerar os Planos de Cargos, Carreiras e Salários e combater de forma intransigente as gratificações que não são incorporadas à aposentadoria foi o que defendeu o presidente do Sindicato dos Médicos de São Paulo, Cid Célio Jayme Carvalhaes, durante o painel Mercado de Trabalho Médico, que aconteceu na manhã do sábado (10.05). Para Carvalhaes é preciso dizer aos gestores de todo o Brasil que eles tenham vergonha de propor salários tão alvitantes para os médicos. A média de salário hoje é de R$ 6.300 para médicos não titulados e R$ 9 mil para os profissionais titulados para uma carga hora que varia de 52 a 68 horas semanais.
Já o presidente do Sindicato dos Médicos do Ceará, Tarcísio Dias, falou sobre a conquista do PCCS dos médicos servidores do município de Fortaleza e da luta atual dos médicos do Estado pelo plano só para a categoria. Entre outros benefícios, os médicos do Estado reivindicam um salário base de R$ 3.751,59 (metade do valor estipulado pela FENAM, que é de R$ 7.503,18); os mesmos benefícios para os aposentados e pensionistas; incorporação de todas as gratificações por ocasião da aposentadoria; e criação de novos critérios para o desenvolvimento na carreira, como promoção por capacitação e progressão por tempo de serviço.
Durante o segundo painel, que teve como tema a "CBHPM – Tabela do SUS – Direito do Consumidor", os médicos defenderam a adoção pelos governos, da remuneração dos procedimentos médicos prevista na CBHPM para a tabela do SUS. Marcos Costa Bichara, diretor da FENAM, disse que a CBHPM é um dos bancos de dados de maior valor do país. Já o presidente da Unimed, José Mairton de Lucena, disse que a cooperativa vem aplicando a tabela da CBHPM há quatro anos, mas que apesar de todo o esforço de fazer com que o médico ganhe mais, quem leva todo esse dinheiro são as empresas de OPME, sigla utilizada para insumos de Ortese, Prótese, Materiais Especiais e Síntese. Em três anos, a OPME aumentou 110% e a produção médica apenas 24%.
Judicialização da Saúde
O último painel da Jornada, "Judicialização da Saúde" discutiu a questão dos medicamentos excepcionais e os pedidos judiciais para compra de remédios que não estão na lista do SUS. Os surgimentos de novas tecnologias e de drogas modernas de alto custo oneram o sistema, que trabalha hoje no seu limite financeiro. Se destinarmos uma soma grande de recursos para um único paciente, quantos ficarão sem cobertura? Só no Sindicato do Rio de Janeiro são cerca de mil mandatos/mês de pedidos de medicamentos.
Para o presidente da Rede Latino Americana de Juizes, Roberto Jorge Feitosa de Carvalho, o judiciário atua como uma força de equilíbrio da sociedade. É o último recurso das pessoas para fazer valer seus direitos. O coordenador Editorial da Revista Jurídica UNIJUS, Jurandi Sebastião reconheceu que o Poder Judiciário sabe muito pouco do que ocorre no universo da medicina e informou que o judiciário está caminhando para ter uma área de especialidade da saúde.
Para o Secretário Executivo do CONASS, Jurandi Frutuoso, o Brasil vive hoje a "demonização do gestor". O gestor nunca tem razão e é sempre incompetente. Ele denunciou o assédio da indústria farmacêutica e que o SUS está sendo torpedeado diariamente. "Estão matando a galinha dos ovos de ouros com más administrações".
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